Al Berto
"A noite está próxima. O que vejo já não se pode cantar
caminho com os
braços levantados, e com a ponta dos dedos acendendo o firmamento da alma.
espero que o vento passe... escuro, lento. Então, entrarei nele, cintilante,
leve... e desapareço."
Al Berto
Abril não é demais!
TERMIDOR ERRADO
(25 de Novembro de 1975)
V
(Chama que nenhum vento apaga...)
A Revolução
parece às vezes que pára
ou que recua
tornando mais funda a escuridão
e a noite menos clara
-como se qualquer Mágica Mão
apagasse o sol dentro da lua.
Mas só os medrosos temem
que a viagem
para a Manhã do Renovo
com limpidez de sêmen
termine? - antes que cheguemos à paisagem
sonhada para o povo
por Lenine.
Não. A nossa Revolução
ainda não acabou
nem tão cedo acaba
- como no alto mar
não gela nenhuma vaga
ao sol de Verão.
Não. A nossa Revolução
continuará,
chama que nenhum vento apaga
- enquanto no coração
dos ricos-senhores
doer a ameaça
de os cavadores vermelhos
(o tojo inútil, os estevais, o rasto
das lebres e dos coelhos)
- guiados pelo malogro,
o asco
e as esperança
da sombra de fogo
da Voz do Vasco
colérica e doce.
IX
E foi para esta farsa
que se fez a revolução de Abril, capitães,
ao som das canções de Lopes-Graça?
Foi para voltar à fúria dos cães,
ao suor triste das ceifeiras nas searas,
as espingardas que matam os filhos as mães
num arder de lágrimas na cara?
E, no entanto,
no princípio, todos ouvíamos uma Voz
a dizer-nos que a nossa terra poderia tornar-se num pomar
de misteriosos pomos.
E nós,
todos nós, chegámos a pensar
que éramos maiores do que somos.
(A Poesia Continua, velhas e novas circunstanciais, 1981)
Inúteis eram as vozes
O cativeiro represo dos sentidos
Abre-se uma comporta e nada altera
A matéria dura de que é feita a vida
Ferros pedaços brancura nunca vista
E um rio que não pára nem descansa
Que perfeita modorra não se esconde
Nesta vasa indecisa e aos ouvidos
Chegam silvos cantantes gargalhadas
E tudo dói como se fora treva
Como se fora vinho nesta névoa
José Afonso
Música nas Pedras
Galeria das deprimidas
Deve ser estranha, sobretudo para fotos digitais, essa sensação de rejeição. Se fossem fotos à maneira antiga, com a aristocracia própria de quem é feita de prata, seria normal uma depressão provocada por essa atitude sobranceira, difícil de aceitar por quem é de sangue azul. Mas, pixéis com sentimento? É ainda mais estranho, fotos proletárias sem posses materiais, apenas com a sua beleza natural não deviam sentir. Deviam ser como as pessoas, em que só os estratos sociais elevados têm sentimentos, os pobres não ficam deprimidos. Já o grande filósofo Oliveira Salazar considerava os pobres como uns animaizinhos felizes, que se contentavam com pouco. As fotos digitais deviam ser assim, felizes na sua pobreza material e insensíveis aos olhares de soslaio de quem é incapaz de apreciar uma foto proletária, simples e sem pedigree.